De sufragistas a abstencionistas

Por Anouk - janeiro 20, 2021


Acabei de (re)ver o filme "As Sufragistas". Para quem ainda não viu, o filme retrata a história de como foi ganho o direito de voto por parte das mulheres no Reino Unido. Foi uma luta desigual, dura, difícil e só possível à custa do sangue, suor e lágrimas de muitas mulheres, que ficaram conhecidas como as "sufragistas", ou seja, as mulheres que lutaram pelo direito ao voto (aka igualdade).

Não foi de todo uma tarefa fácil, e tiveram que sacrificar os seus empregos, família e vidas. Penso que na altura essas mulheres acreditaram piamente que iria valer a pena porque adquirido esse direito, ficaria para sempre. Em teoria será verdade (a não ser que nos aconteça algo como no Afeganistão), mas até lá podemos dizer que sim.

Mas este filme fez-me pensar no seguinte: o que diriam as sufragistas do início do século XX se vissem a taxa de abstenção das suas congéneres nos últimos anos? Seria para isto que teriam abdicado de tanto nas suas vidas naquela altura? Acho que ficariam tristes e revoltadas ao ver este triste cenário a que chegámos.

A título de curiosidade: sabiam que o primeiro país a reconhecer o direito de voto às mulheres foi a Nova Zelândia em 1893? Na Europa, foi a Finlândia em 1911. 

E em Portugal?

A recém-criada república em 1910 concedeu o direito de voto aos portugueses, maiores de 21 anos que soubessem ler e escrever e aos chefes de família (sem mencionar o género).

Aproveitando essa lacuna na legislação, Beatriz Ângelo, médica e viúva, participou nas eleições para a Assembleia Constituinte a 28 de Maio de 1911, invocando a sua qualidade de chefe de família alfabetizada. Foi a primeira mulher a votar em Portugal e entrou assim para a história do sufrágio nacional.

Mas a sociedade masculina não gostou desta ousadia de Beatriz Ângelo e alterou a legislação, passando a discriminar que apenas os homens poderiam votar, fazendo com que o voto só fosse autorizado às mulheres em 1931, com limitações. Só as mulheres com ensino secundário ou universitário é que poderiam votar.

A discriminação sexual só foi abolida por completo do sufrágio a 26 de Dezembro de 1968, passando a estar excluídos todos os cidadãos (independentemente do género) que não soubessem ler e escrever.

.........

Ou seja, passados 52 anos deste direito (algo muito recente na história), nós mulheres esquecemo-nos do que passámos e simplesmente ignoramos o difícil que foi chegar até ao direito que temos hoje, que no fundo está relacionado com o papel das mulheres na sociedade.

Se existisse uma máquina do tempo, e uma sufragista chegasse aqui hoje e visse isto... acho que quando voltasse ao seu tempo já não se iria esforçar para ganhar o direito de voto. Ficava apenas a raiva e frustração.

Em suma, compreendo que possam não se identificar com nenhum candidato, mas para isso existe o voto "em branco". Este sim, passa uma mensagem clara de que nenhum candidato é considerado "digno". Já a abstenção passa apenas a mensagem de que "estava frio, estava a dar a novela e/ou não apeteceu tirar o rabo do sofá"...

Por isso, tropas, o que vos peço é que levantem o rabo dos sofás e por favor não se esqueçam de exercer o vosso direito/dever de voto este domingo. Em quem quiserem... mas votem!

Se não o fizerem por vocês, pela vossa família ou pelo vosso país, façam-no em memória das sufragistas por todo o mundo que tanto lutaram para que nós hoje pudéssemos fazê-lo livremente.

Eu voto! E tu?

Anouk.


Imagem: cottonbro em Pexels.com

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12 comentários

  1. OLá, Anouk!

    Muito bom o teu texto! Um abre olhos para as/os abstencionistas.
    Nunca falhei uma votação e não pretendo falhar nenhuma. Domingo lá estarei...

    Beijinhos
    Liliana
    Ideias Recicladas e... não só!

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    1. Olá Liliana,
      Muito obrigada pelo feedback. Fazes muito bem em usar o teu direito 😉.
      Beijinhos

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  2. Muito bom! Eu levava um estalo das sufragistas. Mas vou ver se posso ainda votar. Beijos

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    1. Lol. Se não conseguiste votar nestas, podes redimir-te em Outubro (e nas próximas, claro).
      Beijinhos

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  3. Muito interessante e útil este post. É sempre bom lembrar as mulheres que tanto lutaram pelo direito ao voto.
    Bjn
    Márcia

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    1. Muito obrigada Márcia. É isso mesmo, é sempre bom lembrar de onde viemos e o que custou cá chegar.
      Beijinhos

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  4. Oh, my grandmother voted so she always made it important for me to go vote. And she was there the first time I voted. She made sure I registered to vote too. I think family support is very helpful. She didn't tell me who to vote for, but to educated myself on who and what I should vote for.

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    1. Thanks so much for sharing your story Ellie. Indeed, family has an important role on how we deal with some things. In this case, you had great support from your grandmother and that's awesome.
      Thanks for stopping by 🙂

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  5. Hoje em dia tanta coisa é adquirida e muitos desconhecem as lutas que se depararam para termos este e outros direitos... Vou porque me diz respeito, porque me preocupo e por respeito por quem lutou! Excelente texto.😘

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    1. É mesmo isso!! É sempre importante lembrar a história para que possamos avançar com consciência para o futuro 😘

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